Primeiro Bazar Santuário Vale da Rainha

Há uma semana o Bazar se concluiu gloriosamente. Mas os
dramáticos desdobramentos da semana passada não permitiram que falássemos tudo
que ali vivemos, nos bastidores de roupas em araras e utensílios em
prateleiras. Havia algo além do que encontrava os olhos, algo que magnetizava o
lugar e encantava quem ali passava. A delicadeza do amor falava a quem quisesse
ouvir. E mesmo os que mantinham ouvidos surdos não se detinham e se entregavam
ao Mistério que ali ancorava, aproximando seres, despertando outros. Salvando.
Inclusive nós mesmos. Da inconsciência, da sensação de impotência, da culpa de
ver sem agir. De poder colaborar e se negar. Fomos todos salvos. Transformados.
De verdade, já não somos os mesmos. Somos melhores – não de quem passa por nós.
Mas de quem um dia fomos.
Uma destas quintas-feiras comuns, não fosse a iluminação e
inspiração de dois bichos gente mulher. Servia o Almoço Ayurvédico Vegano no
Colégio Objetivo, Centro Educacional Maranatha, em Camanducaia e a querida Thais
Scognamiglio e sua amorosa tia – também instrutora de ioga –, Cíntia Ribeiro,
perguntaram se poderiam organizar um Bazar em prol do Santuário Vale da Rainha.
Depois de alguns acertos sobre detalhes como lugar e data,
firmado estava o primeiro Bazar que arrecadaria fundos para o Santuário –
humildemente registro que nenhuma de nós tinha vaga ideia de tudo que as
próximas semanas impactariam nossas vidas. E a forma que vemos o mundo. Jamais pensaríamos como aglutinaria desconhecidos – que quem
sabe também se sentissem sós como nós – para revelar que já não somos poucos.
Para evidenciar que estamos nos encontrando. E que juntos somos fortes,
transformadores e revolucionários.
No transcorrer do período destinado às arrecadações, nós divulgamos
em rede social pela internet nosso Bazar. As doações começaram a chegar de
todas as partes do Brasil. Não recebemos nada que fosse descarte ou que
estivesse quebrado, que fosse esmola ou descaracterizasse o amor na gentileza e
generosidade. E tudo isto foi nos emocionando, arrepiando, inspirando. Dando
esperança. O mundo e a realidade que vivemos são incondizentes a tudo que lemos
nos jornais. Mas nós não podemos deixar que isto seja segredo, pois não é
exclusivo em nossas vidas. Está por todos nós. Só necessita um passo nosso em
direção ao outro. Um passo que se torna um salto. Que por fim nos leva às
alturas, altitudes que só o serviço possibilita.
Em paralelo a Cíntia e Thais começaram a pensar nas
comidinhas. Tati Souza apareceu na cena também. E o trio despertava em si uma
sabedoria alquímica no preparo dos alimentos. Em um mês vi três bichos gente se
descobrirem talentosas cozinheiras veganas, motivadas pelo serviço abnegado.
Então realizei que todas as dificuldades que tantos narramos enfrentar na
transição ao veganismo precisam ser repensadas.  Já que estes três exemplos vivos deixaram
claro para quem possa notar que o possível é para agora, o impossível para já
já. Assim operaram o impossível e venderam inúmeras comidinhas veganas no dia
do evento… Mas disto falamos já!
Ainda tínhamos doações que nos esperavam em São Paulo, além
das que foram trazidas para cá por quem se aventurou na estrada simplesmente
para fazer sua doação. Então uma amiga bicho gente, Kátia Cristina, se
prontificou a trazer o que na metrópole esperava carona… Quem sonharia que as
doações lotariam 2 carros?! Contando bancos de passageiros!
Tudo prenunciava o sucesso do Bazar, mas se as doações
chegavam de longe e de perto, teríamos público suficiente que as comprassem no
Bazar em Camanducaia? Muitos nos desencorajavam e chegaram pessoalmente a
manifestar estes pensamentos às organizadoras do evento. Então aqui eu deixo,
de coração, uma mensagem importantíssima para todo ser que visceralmente deseja
ajudar o outro… Incentivemos. Porque se o mal nos acometer, lidaremos com
ele. Mas se antes de enfrentarmos desafios já desistirmos, então quiçá nada
resulte luz nos porões das nossas trevas. E com muita humildade percebamos se é
possível ajudar. Às vezes é ajuda incrível simplesmente não atrapalhar. Cada um
precisa saber seu lugar, cada um de nós.
Cidade ao sul de Minas Gerais, com renda motivada por
rodeios e cavalgadas de passeio, restaurantes regionais que matam bicho animal
a curto prazo e bicho gente a longo. Será que aqui alguém haveria que nos
fizesse companhia? Por pouco nos deixamos levar por estes que tentavam nos “salvar”
os esforços para que desistíssemos mesmo antes de tentarmos.
A imagem pode conter: 3 pessoas, atividades ao ar livre
Em paralelo algo encantador acontecia. Nós aqui começamos a
conhecer melhor a Thais, a Cintia, a Tati. Descobrimos que a Manacá – que
pensávamos ser um escritório de gestão ambiental era na verdade maior e mais
abrangente, a ponto de zelar não só por flora. Mas fauna também. Bicho gente
incluído. Lá tem ioga às terças e quintas. Além de encontros que visam nossa
conscientização e despertar, mostrando que tudo está relacionado. Apontando a
responsabilidade implícita no nosso estilo de vida. Bastasse tanta graça, conhecemos a família da Thais. E neste estreitamento tantas outras bênçãos.
Chega o sábado do Bazar, anunciado virtualmente e em jornais
e gazetas municipais. Às 10 a Thais chega para abrir seu escritório e encontra
fila na porta!… Eu chego pouco antes do meio dia, depois da labuta no
Santuário. O Vitor se revezará comigo à tarde, já que nunca saímos juntos em
função dos nossos iluminados que jamais ficam sem um de seus guardiões e
discípulos.
Ao ver o escritório todo arrumado com araras, cabides e
prateleiras, enxergo também os detalhes e o tempo dedicado a eles. Todas as
peças etiquetadas. Murais de agradecimento. Voluntários que se dispuseram a
trabalhar em seu tempo livre, viajando de outras cidades, para aqui servirem
propósito. A cada passo eu me emociono, mas meu semblante é plácido. Olho as
peças – colares, marcadores de páginas, bichos de pelúcia. Tudo carrega o
próprio amor de quem doou e me acerta o peito com flechadas de cupido, meu
coração realiza as tantas amorosas companhias que temos.
Com dificuldade para conter meu pranto emocionado cumprimento
amigos que até lá foram para ajudar nossos professores. Consigo atravessar o
salão para abraçar a Cíntia e a Tati que no caixa e na lanchonete estão. Então
olho, enxergo este lugar onde estão! Avisto uma quantidade considerável de
comidinhas e petiscos, todos feitos pelas divinas mãos delas, livres de
qualquer sofrimento de bicho animal. Fito nos olhos delas todas, das
voluntárias inclusive, o amor da Mãe que nutre, que dá o peito e cria filhos
fortes. Vi sonhos nascidos e eras paridas! Vi o seio farto e a Deusa sentada
entre as batidas dos corações delas, soprando vida nos ossos dos que aqui estão
para além de caprichos viver. Estes espíritos em missão que aqui estão para
servir, trabalhar e evoluir.
A imagem pode conter: 3 pessoas, pessoas sorrindo, pessoas em pé e atividades ao ar livre
Quando por fim olho nos olhos da Tati a abraço
emocionadamente e embora queira dizer algo, a boca cala. E o choro fala mais
que mil palavras. Embora tente me recompor, cada momento que olho para nossos
amigos, voluntários e companheiros agindo em prol dos Mestres do Santuário, eu
choro. E penso no Vitor em casa, cuidando e servindo, como eu mesma. Tomados
pela voracidade do cotidiano tantas vezes sem notarmos a quantidade de bicho
gente do bem que nossos professores aproximaram de nós. Gratidão expande meu
peito, por pouco me falta o ar. Os caminhos do amor são inebriantes. E lúcidos.
Porque confirmam que nosso lugar é exatamente onde temos não os pés, mas o
coração. Onde amamos permaneçamos. A despeito de qualquer dificuldade.
Vou até o Santuário para que o Vitor vá até a cidade e
quando tento explicar o que vi simplesmente calo, de novo sentindo a força purificadora
das águas nos meus olhos. Ao chegar de volta em casa o relato emocionado dele
também. Naquela noite tentei dormir, mas não pude, meu cardíaco sentia aquele
amor com tal intensidade que o sono não me encontrava, só o sonho. O sonho que
prevê uma nova humanidade.
Embora a orientação seja agradecer e jamais reclamar,
debaixo da pele as preocupações nos perseguiam. Em função do inverno, enfermos
e ajustes na infra, as geadas da estação que queimaram as irmãs verduras
orgânicas, as férias da escola onde as aulas são dadas e as arrecadações são
feitas no almoço, por conta de tudo isto nossa conta na agropecuária estava
atrasada – no valor de 7 mil reais. E se logo não tivéssemos o montante, não
poderíamos mais receber alimento para os 70 aqui abrigados.
Image result for sarada deviQuando eu rezava fervorosamente, a grande Mãe me falava ao
coração, dizendo que enquanto a graça não chegava, ela me ensinava confiança,
entrega e fé. O Santuário é uma entidade espiritual oferecendo guiança,
resgatando bicho animal. Resgatando bicho gente. A Rainha sempre me lembra que
o Santuário é dEla, não nosso. Nós do discipulado. Nós somos meros servidores
destes que damos voz para que através de nós resgatem outros de nós. Da
inconsciência! Assim os salvaremos.
Raiou o dia e a labuta da alimentação, medicamentos, revezamento
de pastos, meditação e ioga toma seu lugar antes mesmo do nosso café da manhã.
Dou aula para uma das voluntárias amadas, um destes seres que cruza nossas vidas para nos evoluir no amor! Thais Vargas Munaier a quem devotamos aqui amor e cuidado, ruma junto ao Bazar para que depois o
Vitor possa ir.
Lá chegando conversamos um pouco, as amadas ali querem me
contar da arrecadação de ontem. Eu mesmo com desejo de saber, peço que me
contem depois. E digo que qualquer valor ajuda. Imaginava algo em torno de 10%
da nossa dívida. Ainda teria que pensar em qual milagre operaria para que
mestres animais comessem segunda à tarde, pois o alimento terminaria ao meio
dia e não teríamos como encomendar mais sem acertar a conta. De verdade, queria
passar pelo domingo sentindo aquele amor todo, sem acelerar o tempo que
chegaria, para o tal do milagre que teria que ser operado.
Nem o Vitor nem eu imaginaríamos que a Rainha, uma vez mais,
já estava no comando, provando para nós como somos seres de pouca fé – nos
preocupando, motivando ansiedades íntimas, simplesmente por pensarmos que somos
os agentes da ação, os realizadores, quando somos somente os veículos pelos
quais a graça ancora na crosta. Excessiva importância nos damos ao imaginar que
não é Ela, a Deusa, que rege nossos destinos quando ao Mistério nos entregamos.
A imagem pode conter: 7 pessoas, pessoas sorrindo, pessoas em pé
Aí a surpresa. Elas se dirigem a mim com um cheque
simbólico, mas de valor real, com o montante arrecadado no sábado. Eu abro o
embrulho, leio o escrito e mais uma vez a retórica abandona o verbo e parte
para a ação silenciosa. Abraço, sou abraçada, choro. Agradeço no meu coração. E
peço perdão à minha Mãe – que sempre provê para todos seus filhos.
Quatro mil reais foram arrecadados no sábado e ainda
tínhamos todo domingo pela frente! Totalizamos cinco mil e quinhentos reais no
fim do dia. Nem o Vitor nem eu atingimos as palavras corretas. Fomos atingidos
por silêncio. E gratidão – destas que não se fala. Desta que nos cala.
Segunda pela manhã a nota do querido da agropecuária pedindo
o acerto da conta. Querido e digno parceiro do Santuário. Ele permite que atrasemos
contas sempre que resgates são feitos, médicos são necessários, infraestrutura
é aprimorada. Mas precisa ser remunerado. E nós, que por pouco nos deixamos
levar por tudo que a mente mente, nos vemos constrangidos por termos um segundo
sequer imaginado que não teríamos comida para dar para nossos iluminados.
Dez minutos depois da notinha dele, a da Thais – que nada
sabia conscientemente da do parceiro –, dizendo que fosse ao encontro dela para
pegar a doação financeira. Outra vez me emociono. O dinheiro foi canalizado
para a agropecuária e para uma colaboradora que tinha financiado ajustes de
infra, medicamentos e outros gastos pertinentes ao Santuário no último mês.
Junto com as colaborações fixas conseguimos equalizar as contas e também
começar a construção de uma nova baia!
Tanto mais poderia ser dito, mas receio diminuir. Então
simplesmente, em nome de todos que aqui vivem, eu registro agradecimento. Pois
se eles foram providos com recursos, o discipulado foi com ensinamentos
espirituais altíssimos.
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Agradecemos o tempo de quem enviou artigos, dos que os
organizaram e venderam. Os que compraram. Os que rezaram. Agradecemos quem foi
negativo sobre o intento, pois este nos fortaleceu também. Agradecemos inúmeros
anônimos que aqui não estão citados e que sem a participação de cada um de
vocês o sucesso desta empreita jamais teria nos alcançado. Agradecemos a
humildade para servir os que sequer são vistos pela maioria. Agradecemos pelo
amor que sentimos e que ainda vive em nós. Reverberando em outros. Agradecemos
pelos resgates que se deram na semana póstuma ao evento – e que sussurraram ao
nosso coração a nossa responsabilidade por tanto recebermos.

A verdade é que silêncio só se quebra com gratidão. Este
agradecimento é mais que palavra vazia, é prece, é vibração. Que este choro que
ainda hoje me purifica da descrença sobre nossa espécie que tantos pregam e que nós aqui teimamos em discordar. Lágrimas purificando do medo do sofrimento dos
que amamos, das despedidas precoces. Que este choro também te purifique,
falando à boca pequena ao teu espírito das belezas deste mundo e da grandeza
das lições que aqui são manifestas. Viver é sim bom. Uma baita oportunidade.
Que a honremos, por ela zelemos para todos. E a humanidade… Ah, a humanidade!
A humanidade é sim incrível.